terça-feira, 24 de junho de 2008


O abraço no vazio


Observo meu pai, arrastar os pés, ao caminhar, uma seqüela da idade, e, tento esmiuçar dentro de mim, uma pequena partícula de piedade, de algum sentimento, e não encontro nada. Sinto-me culpada, mesquinha, pequena ao perceber que não consigo esboçar a mínima emoção. Deveria tentar relevar, dar uma concessão, por ele estar enfrentando uma velhice quase solitária, mas me sinto incapaz de conceder tal sentimento. Mas em contrapartida, aparecem as mágoas os ressentimentos, a frieza dos momentos em que eu desejava apenas o carinho, a presença de um pai. E ele esteve sempre presente, mas era como se não estivesse, tal era e sempre foi a sua falta de amor paterno. Queria quando menina sentar no seu colo, sentir seu abraço, sentir seu carinho, e, no entanto, o que me retornava era uma frieza desmedida, um desamor imenso, que me deixava triste e sem nenhum chão, nenhum alicerce. Queria poder contar com ele nos momentos em que só um pai, consegue dar o que necessitamos, ou seja, apoio, solidariedade, amor sem restrições. E assim foi ano, após anos, vida, após vida, e permanece até hoje. Zelo por ele, pois está comigo. Certamente seus últimos instantes de vida, serão ao meu lado. Cuido dele, por um ato de benevolência, consciência, não sei definir. Tento não esmorecer e cumprir minha tarefa, mas é dolorido, porque amo, amo a todos, mas não consigo amar meu pai.