sábado, 8 de novembro de 2008

Hoje é dia de Cecília

Blogagem coletiva em homenagem a Cecília Meireles

iniciativa do blog "Na dança das palavras"

Retrato




Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida a minha face?


Cecília Meirelles e o tempo



Escolhi este poema, porque ele me remete a minha infância e um pedacinho de minha adolescência. Seus versos, densos e ao mesmo tempo de uma suavidade etérea me marcaram, de uma forma afetiva, mas que na época, não consegui delinear sua conotação real.

Quando mais tarde, já na maturidade eu os reli, tomei conhecimento de sua beleza profunda e visceral:

Eu não tinha estas mãos sem força, tão paradas e frias e mortas;

A constatação da velhice e da morte eminente, a amargura retratada fisicamente.
A ausência de sentimentos, desenhada em um coração sem forças para esboçar qualquer emoção.

E então a presença do tempo inexorável, onde tudo passou tão rápido, tão veloz que não foi possível esperar a velhice, abrir as portas para o tempo implacável.

E assim acontece com o ser humano. Percorremos o caminho do tempo, quase sempre, sem perceber que ele é como a velocidade da luz.Os anos se avolumam, e não realizamos sonhos.
Perdemos, o amor, num espaço, num segundo, e assim a vida, nos escoa por entre os dedos e não nos é possível segurá-la, não nos é permitido retomá-la para fazer o que deixamos escapar.
A vida não tem uma via de duas mãos. Não tem retorno.