quinta-feira, 11 de setembro de 2008


Divergir


Dela, nada sabia. Nem interessava saber. Sabia apenas da boca, carnuda, que
pedia beijos freqüentes, dos cabelos inquietos, que por vezes, desciam-lhe, pelos ombros quase chegando aos seios. Esses eram ousados, imaginava que sua cabeça ali repousaria, como num travesseiro macio, onde teria sonhos incandescentes, se fechasse os olhos. Sabia de cor a cadência de suas ancas, quando por ele, passava, como se entoasse uma canção, sensual, num ritmo molejante. As pernas, longas, já antevia entrelaçando suas costas, aprisionando-o com feracidade. Todos detalhes físicos lhe eram familiares, como se a olhasse numa fotografia, todos os dias.

Nunca ouvira sua voz, mas devia ser macia e quente, numa harmonia natural, com o corpo.Os dentes, esses, desconhecia, porque jamais a vira sorrir. Deixava, entrever uma tristeza fugidia, no olhar. Mas não inspirava mistérios. Parecia transparente, apesar da tristeza. Esta parecia ser declarada, sem subterfúgios. Ele não queria seu interior, ambicionava, suas externas, não seu casulo.

O desejo físico era-lhe mais premente! Necessitava estar com ela. Era uma urgência da qual não conseguia fugir. A oportunidade surgiu, sem que ele nem esperasse. No elevador, somente, os dois. As respirações, quase, afinadas, eram o único som, no silêncio flutuante do elevador.

Ela de olhos baixos, só vislumbrava a sombra dos cílios espessos. O desejo apresentou-se, afoito, passional, descendo do seu ventre, até o centro do seu corpo. Latejava, chegando a doer, numa ânsia descontrolada. As mãos suavam, frias, e tremiam como se estivessem fragmentadas do resto de seu corpo.

Tudo exigia um controle imediato, mas estava desprovido de qualquer comando. Os pensamentos enviavam mensagens, desconexas, sem qualquer rumo. O coração parecia retumbar no vazio, emitindo ecos ensurdecedores. A ressonância, contundente, chegava-lhe aos ouvidos, deixando-o ensurdecido.

Sentindo-se aquecido, percebeu o corpo quase colado ao seu. No mesmo instante, um calafrio, percorreu-lhe sua espinha, estremecendo-o. O corpo uniu-se ao seu, ensaiando uma dança uniforme.Movimentavam-se vagarosamente, numa tortura ondulante.

As mãos quentes insinuaram-se, pelo seu peito, desenhando, carícias, leves, usurpando seus sentidos. A boca carnuda e atrevida delimitou seus lábios, descendo pelo pescoço, e estancando-se no pomo-de-adão, ali sua língua generosa postou-se em círculos frementes.

Buscou-lhe uma das mãos trêmulas e a guiou, por sob sua saia, até a moradia da sua volúpia. Sua mão atrapalhada buscou o centro do desejo, e ouviu um débil gemido, ininteligível. Uma de suas pernas laçou-o pela cintura, ficando assim, mais exposta, mais acessível. Quando sua boca jogou-se, em busca daquela boca pecaminosa, ele estancou!

Sua passionalidade esvaiu-se, escoando-se numa queda vertiginosa. Sentiu-se fraco, impotente, desfalcado em seus sabores! Enxergou-se ridículo e num trejeito, num esganar de dor, desvencilhou-se daquele corpo de promessas que jamais consegueria cumprir.

Como um covarde, que era desertou do paraíso, que se descortinava, e do gozo, espontâneo, que aqueles olhos desnudavam. Chegou a sua casa, vazia, onde em cada canto jazia uma tristeza escondida. Foi para seu quarto, deitou-se em sua cama, fria e que jamais acomodaria outro corpo, que não o seu.

Estendeu-se e fitou o teto, com olhos desabrigados e concluiu, que tinha subtraído covardemente, de sua existência a etérea e inigualável entrada para a genuína paixão. Sem limites para o prazer.
Seria lhe concedido uma nova oportunidade?
Bem provável, que não!