segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Fazer o sonho acontecer





“Quero falar de uma coisa
Adivinha onde ela anda
Deve estar dentro do peito
Ou caminha pelo ar
Pode estar aqui do lado
Bem mais perto que pensamos.”



Anos 70: O Brasil, fervilhava em emoções intensas e inesquecíveis. Encerrava-se o “Ciclo das Vanguardas”, na sociedade brasileira e posteriormente a derrota das esquerdas armadas, na metade dos anos 70. Cidadãos brasileiros foram covardemente torturados, e outros tantos dizimados e abatidos como animais, despedaçando famílias. Uma caça aos ideais! Nas artes, ocorre o desgaste do “Tropicalismo”, ou seja, a expressão mais adequada do “Vanguardismo Artístico” brasileiro. Desponta uma nova etapa na política de esquerda. O nascimento do Partido do Trabalhador (PT). Na política e na cultura, esboçava-se uma revolta latente contra a Ditadura, enfiada goela à baixo, nos brasileiros!


“A folha da juventude
É o nome certo desse amor
Já podaram seus momentos
Desviaram seu destino
Seu sorriso de menino
Quantas vezes se escondeu.”



O grito de protesto ecoa, nos cantos do País, em caráter de músicas e peças de teatro, entre outras manifestações culturais. O que foi duramente combatido pelo sistema imposto! Mas deixaram marcas profundas na memória de muitos brasileiros.
A punição ocorreu: exilando, torturando e destituindo a liberdade dos artistas que ousavam se manifestar de forma avessa ao que acontecia nas ruas, e nos bastidores do país! A censura fincava seus pés sem piedade!
Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Geraldo Vandré, tiveram suas músicas esmiuçadas e retalhadas pela “tesoura” dos censores.
A cultura estava sendo castigada!
Geraldo Vandré foi duramente punido, sendo torturado, por ter composto a música “Pra não dizer que não falei das flores”. Foi considerada um “toque de reunir” das forças armadas, devido a sua letra, até hoje lembrada:


“Vem vamos embora/Que esperar não é saber/Quem sabe faz a hora, não espera acontecer!”

Custou-lhe o exílio, na seqüência, a tortura! E supõe-se que tenha enlouquecido!



“Mas renova-se a esperança”.
Nova aurora a cada dia
E há que se cuidar do broto
Pra que a vida nos dê flor e fruto.”



Nos anos 75 e 76, foragida de uma educação rígida, ditatorial, tornei-me bancária, desfrutando minha liberdade, tão duramente conquistada! Andava na transversal dos acontecimentos do meu país. Devido a uma sede de viver contundente, tornei-me alienada aos fatos trágicos, que ocorriam a todo o momento. Enquanto eu vivia plenamente e fazia planos para o futuro, jovens como eu, eram torturados, vilipendiados e morriam nos “porões da ditadura!”.
Enquanto, eu comprava roupas, cursava um curso de modelo, e me sentia bonita e cheia de vida, mulheres de minha mesma idade, despojavam-se de suas vaidades e aliavam-se às lutas.

Ao casar-me mais tarde, com um colega, e militante ativo, passei a participar com ele dos piquetes e greves bancárias, tentando assim buscar a contrição pelo meu pecado de “alienação passada”.



“Coração de estudante
Há que se cuidar da vida
Há que se cuidar do mundo
Tomar conta da amizade”



Um dia, caiu em minhas mãos o livro Brasil: Nunca mais
Baseado em depoimentos de entidades vigilantes dos direitos humanos.
Relatava com detalhes claros e crus, o que se passava nos bastidores das prisões, da ditadura.
Estarrecida com a crueldade descrita em cada linha, penitenciei-me diante do meu descaso! Com um remorso, dilacerante (o único que senti até hoje), meu coração fez-se pequeno e medíocre! E mesmo tendo reformulado minhas atitudes e tendo uma outra postura diante dos fatos, me senti culpada, mortificada, por ter fechado meus olhos para tudo aquilo e tê-los voltados para coisas banais.

Num acordo com minha consciência, vivenciei, vibrei, com maturidade e consciência patriótica, com o “Impeachment” em 15 de março de 1990, do então presidente Fernando Collor. Com a eleição de Lula, em 2003 e de outros fatos políticos do meu país e do meu estado!






Hoje convivo com uma realidade política, que extinguiu meus sonhos.
Minha esperança por um país melhor tornou-se efêmera, frágil, passando a convergir com a desilusão da maioria dos brasileiros.
Mas ainda tenho a utopia de que minha esperança faça um conúbio com meus sonhos adormecidos, e a chama reascenda e aqueça meu coração de brasileira, que ainda sabe lutar por ideais e por vida mais digna.



“Alegrias e muitos sonhos
Espalhados no caminho
Verdes, planta e sentimento
Folhas, coração, juventude e fé.”


Sobre o livro Brasil: nunca mais
“O grande objetivo do livro é que ninguém termine sua leitura sem se comprometer, em juramento sagrado com a própia consciência, a engajar-se numa luta sem tréguas, num mutirão sem limites, para varrer da face da terra a prática das torturas.”

James Wright